domingo, 29 de março de 2009

desnuda

A nudez que em mostra,
tão bela, exposta
na tela, de tinta se fez...

Mas esta me mentiu,
sem tecido, encobriu
mais que o corpo
mais que a alma.

Me mostrou um nada...
vazio...

E me enganou novamente
quando sem aviso, indecente,
seu vestido caiu.

Me mostrou a beleza,
completa...

A nudez da tela, em tinta
Tão real quanto bela
ao meu lado reside...
contra seu peito, me aperta.

domingo, 15 de março de 2009

ão

num passo, o tempo passará
e todos os passarinhos passarão.

passariam,
se não fosse o avião.

01.03.09

quarta-feira, 11 de março de 2009

-À Parte Apartada

Não quero seus olhos,
Nem sua boca ou seus afagos.

Quero os teus olhos,
Que assim, poderei tocar...

Quero tua boca e teus afagos,
Que me agradam
E me engradam,
Apenas um entreposto qualquer
Feliz de pertencer
A um canto que seja
Do teu coração-empório, mulher.


(H. Chiurciu et G. Iunes)

-Posfácio

Que mais a dizer
Além do piso frio,
Imóvel, morto, estático...

Eis, tático:
O que há no mundo além disso?

(H. Chiurciu et G. Iunes)

-Ma Non Troppo

No canto da estante,
Um instante,
Que, estanque,
Se quedou entre nós dois.

E aquele copo,
Aquela conversa doida,
Que nunca mais se repetiria...

Ficou tudo gravado
Naquela velha estante.


(H. Chiurciu et G. Iunes)

sexta-feira, 6 de março de 2009

DeLírios

Ahhh... Desse cara eu sei bem. Chegou meio assim, no auge da vida etílica, andando em compasso composto. Estávamos sentados em círculo, discutindo como seria a tarde. Não sei, mas algo o incomodava, ou o pressionava a falar, a contar a novidade:
-Ei você, sabe o que vão plantar no canteiro?
Eu não sei, não... muito menos as pessoas que vomitavam palavras ao meu redor. Nenhuma delas lhe deu atenção. Foi quando ele tentou procurar:
-Eu tava lá, numa reunião de advogados... me trataram tão mal lá. Eu cheguei e todas as garotas pagaram um pau pra mim. Até chegar aquela menina peituda, que me achou nada a ver, e todo mundo foi na dela... Tinha um cara lá, com um óculos-fundo-de-garrafa e com uma namorada linda, linda. Ela dançava muito!
E conseguiu ao menos um interessado, mas já não tinha mais paciência pra esse tipo de pessoa. Onde já se viu, fazer aquela pergunta?
-Como assim ‘o que ela dança’? Ela mexe a bunda, cara! Ela mexe a bunda a vida inteira!
E prosseguiu indignado. Como aquelas pessoas falavam da tarde vazia, e não do canteiro que estava pra ser preenchido? Ele sabia o que era, mas ninguém queria saber. As palavras brotavam de sua boca com uma naturalidade sem tamanho, ele tinha motivos pra estar daquele jeito, a gente não. Gostava de poesia e se irritava com essas parafernalhas eletrônicas. As coisas à mão são tão mais graciosas, disso ele tinha razão. Mas ninguém se importava, ao ponto do surto e das variações de comportamento que o rapaz tinha.
Agora ele ameaçava o cara, o outro cara, o que discutia a tarde. Ele odiava esse tipo de gente, pelo menos quando ele estava daquele jeito. O outro cara, o que não participava de nenhuma discussão, perdeu a paciência. Sem pensar, igual à figura tão hostil aos nossos primeiros olhares, fez o taco zunir pelo ar e encontrar a cabeça, que só pensava no canteiro. Não pensou na dor. Eu pensei, quase desmaiei por ele. Ele foi para o canto, o cachorro, encolhido. E antes de sair, disse à quem quisesse ouvir:
- No canteiro serão plantados lírios. Lírios.
Que estavam me obrigando a contar o ocorrido, mesmo sem o lirismo que me imploravam.